Por Lucas Machado ABRASEL
Mudança fortalece o debate sobre inclusão e motiva projetos que transformam a experiência de frequentar restaurantes e espaços de convivência
O conceito de acessibilidade está mudando,
e não apenas nas leis, mas também na forma de ser representado. Em 2024, o
Brasil passou a adotar oficialmente o novo símbolo internacional de
acessibilidade, criado pela ONU em 2015. O desenho, que mostra uma figura
humana de braços abertos envolvida por um círculo, substitui a tradicional
imagem da cadeira de rodas e simboliza um entendimento mais amplo sobre
inclusão.
A mudança vai além da estética. Ela
expressa uma transformação de mentalidade: a acessibilidade deixa de estar
associada apenas à mobilidade física e passa a abranger diferentes tipos de
deficiência, como as auditivas, visuais, intelectuais e psicossociais. Mais do
que rampas e elevadores, ela envolve comunicação, respeito, empatia e
adaptação.
Segundo o defensor público e professor
Allan Joos, a nova imagem representa uma virada simbólica no campo dos direitos
humanos. O antigo símbolo refletia um modelo biomédico da deficiência, centrado
na limitação do corpo. O novo reflete o modelo social, que identifica as
barreiras atitudinais e estruturais como os principais fatores de exclusão,
explica em artigo sobre o tema.
O projeto que oficializou o novo símbolo no
Brasil, o PL nº 2.199/2022, aprovado no Senado Federal, integra uma agenda
maior que busca fortalecer o cumprimento da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência (CDPD), documento da ONU incorporado à Constituição
brasileira. O objetivo é tornar a comunicação pública mais inclusiva e
representativa, reconhecendo que pessoas com deficiência não formam um grupo homogêneo,
mas sim uma diversidade de experiências e vivências.
Essa transformação simbólica ganha ainda
mais sentido quando se observam iniciativas concretas que tornam o cotidiano
mais acessível, especialmente em espaços de convivência e lazer.
Acessibilibar: mapeamento da inclusão na
vida real
Em Belo Horizonte, conhecida pela forte
cultura de bares,
nasceu um projeto que traduz em ação o que o novo símbolo propõe em imagem. Criado
pela jornalista Aline Castro, o Acessibilibar é uma iniciativa pioneira que
avalia o grau de acessibilidade de estabelecimentos da capital mineira.
Aline nasceu com atrofia muscular espinhal
e usa cadeira de rodas desde a infância. Sempre levou uma vida ativa, mas
encontrou muitos obstáculos para frequentar os espaços de lazer da cidade. As
dificuldades para circular, encontrar banheiros adaptados ou mesas adequadas
fizeram com que ela transformasse sua experiência em propósito.
“Recebia muitas mensagens perguntando se eu
conhecia determinados lugares e se eles eram acessíveis. Infelizmente, mesmo a
acessibilidade sendo uma lei, ela ainda não é cumprida por falta de
conscientização”, relata.
Com base nessa demanda, Aline passou a
visitar estabelecimentos e avaliar critérios como rampas, banheiros adaptados,
espaço entre mesas, cardápios acessíveis e preparo das equipes. Os locais que
atendem aos requisitos recebem o selo Acessibilibar, uma
forma de reconhecimento e estímulo para que mais empreendedores invistam na
causa.
Para ela, a acessibilidade não significa
apenas permitir a entrada de pessoas com deficiência, mas garantir que possam
permanecer com dignidade e conforto. “Vejo que hoje as pessoas sequer sabem o
que é acessibilidade. Muitas casas têm rampa de entrada, mas o problema começa
quando você precisa usar o banheiro ou quando as mesas são altas demais para um
cadeirante”, explica.
O projeto também funciona como ferramenta
de conscientização. Aline defende que tornar um espaço acessível é uma
responsabilidade compartilhada entre Estado, empresários e sociedade. “A
acessibilidade deve ser uma questão de todos. É preciso apoio governamental
para implementação e fiscalização, mas também é essencial que os donos de
estabelecimentos entendam que tornar seus espaços inclusivos é um investimento
que beneficia a todos”, afirma.
Desde o início do projeto, o impacto é
visível. Muitos estabelecimentos que receberam o selo fizeram melhorias
estruturais e treinaram suas equipes para oferecer um atendimento mais
inclusivo. Aline planeja expandir o Acessibilibar para outras cidades e
transformá-lo em referência nacional.
No Rio Grande do Sul, um restaurante
pensado para o público autista
Enquanto o Acessibilibar avalia a
acessibilidade em diferentes negócios, um pequeno restaurante no Rio Grande do
Sul mostra como é possível aplicá-la de forma concreta. O Espetinho do Vini,
localizado em Guaíba, foi criado pelo casal Vinícius e Kelli Longaray, pais de
Enzo Gabriel, de cinco anos, diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista
(TEA).
A ideia surgiu de uma experiência pessoal.
“Sabemos a dificuldade que é sair com nosso filho e não encontrar uma área
adequada para ele se acalmar”, conta Vinícius. Foi assim que decidiram adaptar
o restaurante para acolher crianças autistas e suas famílias.
O espaço tem ambiente silencioso, luz suave
e uma área sensorial com brinquedos específicos, além de fones de ouvido
disponíveis para quem se incomoda com barulhos fortes. As mesas trazem adesivos
com informações sobre o autismo, o que ajuda os demais clientes a compreender o
transtorno.
A iniciativa fez sucesso e transformou o
restaurante em ponto de encontro de famílias com crianças autistas. Thainá
Moraes, mãe de um menino com TEA, é uma das frequentadoras assíduas. “O
ambiente é bem acolhedor, não tem som alto e os brinquedos sensoriais ajudam
muito. Podemos comer tranquilos e deixar as crianças brincarem com segurança”,
conta.
Além da estrutura, o Espetinho do Vini
também adaptou o cardápio. Vinícius percebeu que muitas crianças autistas têm
seletividade alimentar e criou um menu especial com pequenas porções a preços
simbólicos, entre R$ 1,90 e R$ 2,90. “Não posso cobrar o mesmo valor de um
prato infantil comum. Algumas crianças só comem arroz com farofa ou batata
palha. O importante é acolher, não lucrar em cima disso”, explica.
A proposta rompeu barreiras e inspirou
outros empreendedores a pensar na acessibilidade de forma mais ampla, levando
em conta também as necessidades sensoriais e comportamentais.
Inclusão como estratégia de fidelização
Além do aspecto social, a acessibilidade
também representa uma oportunidade de crescimento para o setor de alimentação
fora do lar. A mais recente pesquisa da Abrasel mostra que 27% das
empresas registraram prejuízo em setembro, 40% ficaram em equilíbrio e apenas
33% tiveram lucro. O levantamento ainda revela que 40% dos estabelecimentos não
conseguiram reajustar os preços do cardápio nos últimos 12 meses e outros 40%
têm pagamentos em atraso.
Diante de um cenário econômico desafiador,
a adoção de práticas inclusivas pode se tornar um diferencial competitivo.
Ambientes que oferecem conforto, empatia e adaptação tendem a fidelizar
clientes e atrair novos públicos, como famílias com pessoas com deficiência ou
necessidades específicas.
A inclusão, portanto, não é apenas uma
pauta social, mas também uma estratégia de sustentabilidade. Um espaço
acessível estimula a diversidade de clientes, melhora a reputação da marca e
reforça o papel do restaurante como um ambiente acolhedor e democrático.
Como resume Aline Castro, “a acessibilidade
não é custo, é investimento”.
O novo símbolo, com seus braços abertos,
parece traduzir exatamente essa ideia. Representa movimento, autonomia e
pertencimento. E, mais do que uma nova imagem, é um convite para um novo olhar
sobre o que significa, de fato, incluir.
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